sábado, 27 de março de 2010

CONFORTO HUMANO É NOCIVO AO MEIO AMBIENTE

Cada vez mais o homem procura o conforto. Desloca-se de um lugar a outro, perto ou longe, sentado em uma poltrona sem despender a energia natural – própria de seu organismo – a muscular. Comunica-se com outra pessoa, numa distância enorme, sem precisar ir lá. Vê o que está acontecendo em qualquer parte do mundo sem empregar esforço físico. Até no âmbito pequeno e simples, há um imenso conforto, como o de não se arredar da poltrona para mudar um canal de TV. Somente move o dedo. Já estão procurando um meio de nem isso precisar. Aparelho sofisticado já está sendo experimentado para que apenas com o pensamento se faça as alterações de uma TV ou computador.

Enquanto estamos usufruindo dessas suaves condições, a contrapartida é que escravos estão produzindo e despendendo suas energias, convertidas em conforto humano. São os possantes motores de aviões ou automóveis, as turbinas hidráulicas e as baterias químicas, movidas pela transformação das energias fósseis, relevo geográfico das bacias hidrográficas e propriedades de força das moléculas.

Isso equivale a dizer que cativamos energias naturais em benefício da comodidade e produção de supérfluos que vão satisfazer a vaidade humana. Mas, como nada é de graça, isso tem o seu custo: envenenamento do ambiente e conseqüente malefício ao corpo humano. Equivale a matar e destruir as condições de vida no planeta. Isso é satisfazer a ganância materialista do poder econômico que só tem um objetivo de vida: lucro.

O conforto é como uma droga: é bom e vicia. Mas é altamente contraproducente. Pela nossa natureza, temos necessidade de exercitar os músculos, e a sua não utilização prejudica imensamente a saúde conforme se pode observar com o surgimento de pessoas obesas, problemas circulatórios, cardíacos. Uns dizem que tais efeitos se devem à alimentação inadequada. Sim, é inadequada ante uma situação de não uso muscular como a natureza e os médicos mandam. Ante uma civilização de nenhum esforço, toda alimentação é prejudicial. O inverso é verdadeiro. Um homem pobre do meio rural, que moureja diariamente em suas lidas, se satisfaz com qualquer alimento e goza de plena saúde.

Temos visto abordagens ecológicas bem intencionadas, mas inteiramente equivocadas. Uns se pronunciam, como James Lovelock, a favor da produção de energia nuclear. Vários receitam a busca urgente de outros tipos de produção de energias, como a solar, a das marés, a eólica. Todos estão mergulhados na linguagem advinda da estrutura social econômica. Essa é uma das formas de pronunciamento antropocentrista que não nos deixa enxergar o verdadeiro vulto do perigo ambiental.

Afinal, nenhum ser vivo tem necessidade de energia cativa para viver. Que ânsia é essa de pontuar a energia? Simplesmente para adicionar força e potência às vontades humanas, para que suas energias provenientes do metabolismo alimentar sejam convertidas em tecidos adiposos prejudiciais à saúde, gerando lucro material. Dirão alguns, em obediência à visão distorcida do antropocentrismo, que os animais humanos não podem ser comparados aos demais seres vivos. Mas justamente ai é que reside o problema de sobrevivência da humanidade. Os focos civilizacionais – incluída a captura de energias – redundam em destruição de nosso próprio hábitat. Isso é irracional, é suicídio. Podemos perfeitamente viver sem a conversão de bens naturais em confortos prejudiciais à vida.

O momento pede urgência e realismo. Sem sacrifício, não conseguiremos redimir os males já causados à Natureza. Não podemos nos ocupar com a busca de melhores energias que só nos levam à atitude antinatural do conforto. Intentamos movimentar o cérebro dos ambientalistas para outros rumos, para outras perspectivas. Precisamos, antes de uma revolução civilizacional, de uma revolução mental para nos livrarmos dos vícios culturais.

O gênero humano é resultado de 3,7 bilhões de experiência vital neste planeta. Somos um organismo resultante de aperfeiçoamentos. Por isso, somos um produto acabado para o momento presente; pelo menos na constituição biológica. Na mental, estamos apenas aprendendo a dar os primeiros passos. Temos que perceber nossa infância mental, sob pena de destruirmos completamente o tão magnífico projeto natural, o homo sapiens.

A natureza nos proporcionou tudo o que necessitamos, inclusive a energia muscular. E é essa energia que devemos usar. Todas as demais, obtidas com a violação do santuário natural, passa a se constituir um aleijão evolucionário.

segunda-feira, 22 de março de 2010

O GUERREIRO OBAMA E O PEIXE FORA D'ÁGUA

FONTE: http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=165485

Por Frei Betto - do Rio de Janeiro

Os usamericanos e o jeito Avatar de ser.

Obama é uma decepção! Recebeu imerecidamente o Nobel da Paz - um presidente que guerreia o Iraque, o Afeganistão e o Paquistão - e, em discurso de agradecimento, pronunciou a palavra "guerra" 49 vezes!

Obama apoiou o governo golpista de Micheletti em Honduras e, agora, ocupa militarmente o Haiti, sob pretexto de socorrer as vítimas do terremoto, e militariza a América do Sul através da implantação de sete novas bases usamericanas na Colômbia, onde já operam seis.

Só mesmo um ingênuo acredita que os 800 soldados e os 600 civis made in USA que se instalam na Colômbia têm por objetivo combater o narcotráfico e o terrorismo. Desde 1952 os EUA se fazem presentes na Colômbia sob o mesmo pretexto; nem por isso houve redução do tráfico de drogas, consumidas em grande quantidade pela população usamericana.

O objetivo da IV Frota é desestabilizar o governo Chávez, manter sob vigilância o Equador governado por Rafael Correa, dificultar as vias aéreas e terrestres entre Venezuela, Equador, Bolívia e Paraguai, e controlar as fronteiras com o Brasil.

O governo usamericano empenha-se em reforçar sua hegemonia no planeta. Hoje, ele mantém 513 bases militares na Europa; 248 na Ásia; 36 no Oriente Médio; 21 na América Latina; 5 na África. Total: 823, que ocupam uma superfície de 2.863.544 km2.

Sabem quantas bases militares estrangeiras há nos EUA? Nenhuma.

As tropas estadunidenses gozam de imunidade judicial e tributária nos países que operam e dispõem da mais moderna tecnologia bélica, desde aeronaves não tripuladas, conhecidas por UAS (Unmanned Aircraft System) aos aviões F15 Strike Eagle com velocidade de 2.660 km/h, autonomia de voo de 5h15min e capacidade de voar a 18 mil metros de altura.

Porém, não é só com equipamento bélico que os EUA cuidam de dominar o mundo. Utilizam, sobretudo, recursos ideológicos, como as produções cinematográficas hollywoodianas tipo Avatar, que visam a nos convencer de que a salvação vem de fora e vem de quem possui mais tecnologia e ciência...

Na última semana de janeiro estive no Equador participando de um evento que reuniu povos indígenas de quase toda a América Latina. Eles se sentem ameaçados, inclusive pelos novos governos democráticos-populares. À exceção de Evo Morales, difícil para os demais governantes reconhecerem que os povos indígenas têm direito à língua, cultura, sistemas econômico e escolar, métodos de produção e terra próprios.

Isso lembra uma antiga parábola oriental: ao observar que o macaco tirou o peixe da água e o colocou no cimo da árvore, a águia perguntou-lhe por que fizera aquilo. O macaco respondeu:

– Para que possa respirar melhor e não morrer afogado.

É esse nosso colonialismo entranhado, essa nossa subserviência aos "valores" consumistas do mundo ocidental, essa reverência ao american way of life, essa convicção de que a felicidade reside na posse de bens finitos e não de valores infinitos, que nos faz tirar o peixe do rio para que possa respirar melhor...

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de Diário de Fernando - nos cárceres da ditadura militar brasileira (Rocco), entre outros livros.

terça-feira, 16 de março de 2010

BELO MONTE: VOLTA DA DITADURA

Divulgamos abaixo esclarecedor artigo do eminente pensador Leonardo Boff. Fonte: Fábio Oliveira – fabioxoliveira2007@gmail.com

Fabioxoliveira.blog.uol.com.br/


BELO MONTE: A VOLTA TRIUNFANTE DA DITADURA MILITAR?

O Governo Lula possui méritos inegáveis na questão social. Mas na questão ambiental é de uma inconsciência e de um atraso palmar. Ao analisar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) temos a impressão de sermos devolvidos ao século XIX. É a mesma mentalidade que vê a natureza como mera reserva de recursos, base para alavancar projetos faraônicos, levados avante a ferro e fogo, dentro de um modelo de crescimento ultrapassado que favorece as grandes empresas à custa da depredação da natureza e da criação de muita pobreza. Este modelo está sendo questionado no mundo inteiro por desestabilizar o planeta Terra como um todo e mesmo assim é assumido pelo PAC sem qualquer escrúpulo. A discussão com as populações afetadas e com a sociedade foi pífia. Impera a lógica autoritária; primeiro decide-se depois se convoca a audiência pública. Pois é exatamente isto que está ocorrendo com o projeto da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu no Estado do Pará.

Tudo está sendo levado aos trambolhões, atropelando processos, ocultando o importante parecer 114/09 de dezembro de 2009, emitido pelo IBAMA (órgão que cuida das questões ambientais) contrário à construção da usina, a opinião da maioria dos ambientalistas nacionais e internacionais que dizem ser este projeto um grave equívoco com consequências ambientais imprevisíveis.

O Ministério Público Federal que encaminhou processos de embargo, eventualmente levando a questão a foros internacionais, sofreu coação da Advocacia Geral da União (AGU), com o apoio público do Presidente, de processar os procuradores e promotores destas ações por abuso de poder.

Esse projeto vem da ditadura militar dos anos 70. Sob pressão dos indígenas apoiados pelo cantor Sting em parceria com o cacique Raoni foi engavetado em 1989. Agora, com a licença prévia concedida no dia 1º de fevereiro, o projeto da ditadura pôde voltar triunfalmente, apresentado pelo Governo como a maior obra do PAC.

Neste projeto tudo é megalômano: inundação de 51.600 ha de floresta, com um espelho d'água de 516 km2, desvio do rio com a construção de dois canais de 500m de largura e 30 km de comprimento, deixando 100 km de leito seco, submergindo a parte mais bela do Xingu, a Volta Grande e um terço de Altamira, com um custo entre 17 e 30 bilhões de reais, desalojando cerca de 20 mil pessoas e atraindo para as obras cerca de 80 mil trabalhadores para produzir 11.233 MW de energia no tempo das cheias (4 meses) e somente 4 mil MW no resto do ano, para por fim, transportá-la até 5 mil km de distância.

Esse gigantismo, típico de mentes tecnocráticas, beira a insensatez, pois, dada a crise ambiental global, todos recomendam obras menores, valorizando matrizes energéticas alternativas, baseadas na água, no vento, no sol e na biomassa. E tudo isso nós temos em abundância. Considerando as opiniões dos especialistas podemos dizer: a usina hidrelétrica de Monte Belo é tecnicamente desaconselhável, exageradamente cara, ecologicamente desastrosa, socialmente perversa, perturbadora da floresta amazônica e uma grave agressão ao sistema-Terra.

Este projeto se caracteriza pelo desrespeito: às dezenas de etnias indígenas que lá vivem há milhares de anos e que sequer foram ouvidas; desrespeito à floresta amazônica cuja vocação não é produzir energia elétrica mas bens e serviços naturais de grande valor econômico; desrespeito aos técnicos do IBAMA e a outras autoridades científicas contrárias a esse empreendimento; desrespeito à consciência ecológica que devido às ameaças que pesam sobre o sistema da vida, pedem extremo cuidado com as florestas; desrespeito ao Bem Comum da Terra e da Humanidade, a nova centralidade das políticas mundiais.

Se houvesse um Tribunal Mundial de Crimes contra a Terra, como está sendo projetado por um grupo altamente qualificado que estuda a reinvenção da ONU sob a coordenação de Miguel d'Escoto, ex-Presidente da Assembleia (2008-2009) seguramente os promotores da hidrelétrica Monte Santo estariam na mira deste tribunal.

Ainda há tempo de frear a construção desta monstruosidade, porque há alternativas melhores. Não queremos que se realizem as palavras do bispo Dom Erwin Kräutler, defensor dos indígenas e contra Belo Monte: "Lula entrará na história como o grande depredador da Amazônia e o coveiro dos povos indígenas e ribeirinhos do Xingu".

domingo, 7 de março de 2010

O ABSURDO DA IMORTALIDADE

Inicialmente, é de toda a conveniência deixar claro que nossos dizeres a seguir constituem uma visão do outro lado do palco. É, por isso, destoante do que geralmente é lido, visto e sentido pelos que se situam como expectadores. Seria como que uma abordagem filosófica, uma pesquisa mental mais ampla e profunda; e dentro dessa perspectiva deve ser apreciada.

O homem é o único ser vivo terrestre que se rebelou contra sua criadora, a mãe Natureza. Tentaremos explicar resumidamente como isso ocorreu.

A Natureza, que tem a energia vital no âmago do átomo, construiu um sistema existencial que se ajusta adequadamente ao hábitat que lhe é oferecido. Essa adequação provém de modificações na formação da molécula complexa chamada ADN. Tais alterações, que se renovam a cada geração, implicam forjar arranjos combinatórios dos quatro elementos básicos que o formam, produzindo erros ocasionais. Esses erros aleatórios constituem o motor evolutivo do ser vivo.

Há dois milhões de anos começaram a surgir alguns antropóides com algumas características ligeiramente diferentes de seus ancestrais. Com o tempo, essa sub-espécie foi evoluindo e sua anatomia produziu uma modificação na laringe com a formação de quatro pregas de membranas vibratórias, proporcionando-lhes a modulação sonora.

O exercício desse linguajar primitivo estimulou o desenvolvimento cerebral. Como conseqüência, esses dois atributos exerceram mútuos estímulos para o desenvolvimento, tornando-se o hominídeo senhor da fala e pensamento. Até então, como todos os seres vivos, esse animal humanóide seguia cegamente as decisões instintivas. Munido, no entanto, com esses privilegiados poderes – fala e pensamento –, passou a tomar decisões por conta própria, rebelando-se contra a orientação vinda do instinto. Foi um ato de afirmação de independência e liberdade e o começo de ações antropocêntricas.

Desgraçadamente, conservou ele alguns instintos sobre os quais não teve instrumental capaz de sobrepujar. Um deles é o instinto de preservação da espécie, o que resultou em detonação – juntamente com outros fatores – de grande poder de ações protetoras da prole.

Inconscientemente, o homem luta contra a Natureza em seu próprio benefício, esquecendo o princípio necessário e básico do instinto de preservação do seu meio de sobrevivência. De uma primitiva religiosidade para com o deus ecológico, migrou sua mística para crenças antropocêntricas. Nessa jornada antagônica, fez tudo para vencer sua mãe Natureza, esquecendo que ele próprio é parte e dependente dela.

Com isso, adorando um deus feito à sua imagem e semelhança, perdeu o sentido da vida que o instinto lhe oferecia e foi cavando cada vez mais o seu próprio túmulo como espécie. Pior: em ações absolutamente irracionais, calcadas em visões abstratas e degeneradas, vai levando à extinção seus irmãos da flora e fauna.

Somente para abordar um único aspecto dessa humanidade rebelde e ególatra, enfocamos o absurdo de sua luta: a preservação da vida pessoal, levando ao paroxismo o instinto de preservação da vida por ações autônomas vindas de sua limitada sabedoria. Não satisfeita com o domínio já conquistado, tenta impedir o roteiro natural da morte.

O homem é o único animal que não tem predador em seu reino biológico. Já obstruiu e eliminou as ações danosas de diversos agentes do micro mundo. A criança, no dia mesmo em que nasce, já é imunizada contra o ataque de bactérias e vírus. O calendário de vacinações é extenso. Começa com a BCG e hepatite B, segue com a DTP e Nib, poliomielite, rotavírus, febre amarela, tríplice viral, influenza, pneumocócica. Isso até os cinco anos. Daí em diante, há outras segundo a idade, como as antitetânicas e hidrofóbicas, até preservar os idosos contra os ataques de vírus sazonais. E sempre estão surgindo novas vacinas. Tudo pode, não pode é o indivíduo fenecer.

No nascimento do ser humano, o projeto natural já traz em seu código genético a sentença de fechamento do ciclo existencial. E a tecnologia médica luta contra isso, num esforço rebelde de contrariar o desejo prescrito pela Vontade transcendental.

Nos países mais desenvolvidos, nos anos 1900, a expectativa de vida em média era de 40 anos. Hoje, informam as estatísticas que podemos atingir a média de 70 anos; quase o dobro. Para quê? Para desequilibrar a harmonia vivencial implantada pela sábia Natureza. A função normal de vida é gerar e criar os filhos no tempo suficiente. Depois, é voltar ao seio energético de onde viemos, dando a outros viventes a oportunidade de cumprir suas jornadas.

Essas considerações nos ocorrem ante a verificação de que a população, mercê dos fatores citados, alcança o total nominal de 6,7 bilhões, correspondendo potencialmente a 670 bilhões por suas ações multiplicadoras. E num momento em que o ambiente já dá seus sinais de esgotamento ou desequilíbrio ambiental.

Somos inconseqüentes quando buscamos a imortalidade pessoal. Ela já é exercida naturalmente por meio da procriação que segue um programa lógico: morrer para dar lugar ao que nasce. Isso é o que deveria ser incorporado à sapiência humana. Esse aspecto representa uma situação benéfica para a harmonia do meio ambiente.

Em que se constitui o meio ambiente? É uma malha em que os elos são interdependentes. Cada espécie viva é um elo desse conjunto. Corolário: cada elo constrói e harmoniza o meio ambiente. Destruindo-se essa ligação, estamos enfraquecendo e destruindo aquele todo, onde ele próprio se nutre e assegura recursos básicos para a existência de sua prole. O homo sapiens extingue 2,3 espécies de seres de nossa flora e fauna a cada hora. É fácil enxergar que chegará a um ponto em que somente ele restará sobre a terra. Teoricamente, claro, porque muito antes disso, o caos do desequilíbrio vivencial se instalará no planeta.

Alcançar a imortalidade! Que objetivo mais inglório e estúpido! Essa afronta à razão e à Natureza ficará sem castigo? Devemos nos conscientizar de que a morte é uma necessidade após o cumprimento dos desígnios naturais. Precisamos entender que somos uma excepcional ferramenta de manutenção da vida e que a Natureza nos protege de todas as formas até o momento em que passamos a ser dispensáveis, prejudiciais, entulhos, lixo.

E nessa ação antecipatória, a Natureza é sábia e amiga. Dá-nos o envelhecimento, que é um suave preparo, um aviso, um desamor e renúncia a bens materiais, a sabedoria. E, no ato final da transição, suaviza nossa mente com o estado de coma no processo natural, ou apaga da memória o tempo decorrido na ocasião de acidentes. Suave é a morte, mesmo quando ocorre em circunstâncias violentas. Só é dolorosa quando contrariada pelos artifícios médicos destinados a prolongar a vida vegetativa, atos inteiramente irracionais.

segunda-feira, 1 de março de 2010

AVATAR - 2a. parte

AVATAR - 2ª parte


Quem conseguiu ler até o fim a primeira parte deste artigo talvez esteja se perguntando: Onde o Antonio quer chegar com essas elucubrações? Minha resposta a esta pergunta será feita com outra pergunta: É possível conciliar desenvolvimento tecnológico com preservação ambiental? Diferentemente das questões apresentadas na parte 1, esta eu vou tentar responder, ok?

Antes, porém, definamos a palavra “tecnologia”. O termo vem do grego tékhne (arte, habilidade, método) + logos (palavra, argumento, discurso e também razão). Portanto, pelo menos do ponto de vista etimológico, podemos dizer que tecnologia é uma exclusividade humana, correto? Discordo!!! Ela foi “inventada” muito antes do Homo sapiens ter surgido por aqui; mais precisamente há (estima-se) cerca de dois milhões de anos, quando um hominídeo metido chamado Homo habilis começou a fabricar e utilizar ferramentas feitas de pau e pedra; e deve ter dado muito certo, pois este quase parente nosso durou mais de um milhão de anos. Para deixar bem claro o que significa este período de existência, posso dizer-lhes que no fascinante “jogo da vida” os habilis estão ganhando de 10 x 2 de nós, os sapiens. . . alguém aí aposta que vamos virar este jogo, hein?

Claro, claro, como atualmente somos os únicos representantes do gênero Homo – será mesmo? – podemos estufar o peito e dizer: Nós temos a Tecnologia!!! É isso aí, parabéns, muito bom, mas. . . e agora? O que a tecnologia tornou-se para nós? Muitos responderiam que ela é uma dádiva. . . mas há também quem afirme que ela é uma maldição. Eu aqui, no meu quase anonimato, digo que a tecnologia pode ser tanto uma coisa quanto outra; algo assim como uma moça volúvel, que acorda abraçada com a vida para depois ir passear de mãos dadas com a morte. E como poderia ser diferente? Afinal a tecnologia é cria da inventividade humana; fecundada, gestada e gerada pelo homem, acaba ficando muito parecida com ele.

Assim sendo, o que devemos fazer então? Vestir tanga e voltar para o mato? Ora, definitivamente esta não é uma saída viável; até porque não haveria mato para todo mundo. James Lovelock começa a responder a questão em seu livro intitulado A Vingança de Gaia:

“Somos uma espécie equivalente àquela dupla esquizóide do romance de Stevenson O Médico e o Monstro. Temos a capacidade de destruição desastrosa, mas também o potencial de edificar uma civilização magnífica. O monstro nos levou a usar mal a tecnologia; abusamos da energia e superpovoamos a Terra, mas não é abandonando a tecnologia que sustentaremos a civilização. Pelo contrário, temos de usá-la sabiamente, como faria o médico, tendo em mira a saúde da Terra, não a das pessoas.”

Bingo!!! Tecnologia combinada com Sabedoria pode sim nos levar bem longe. Porém, frequentemente, a Tecnologia tem sido seduzida por outra companheira: a Economia. E neste triângulo amoroso, a Sabedoria, muitas vezes, vai dormir no sofá.

Respondendo à minha questão inicial digo que SIM, desenvolvimento tecnológico e preservação ambiental são perfeitamente conciliáveis. . . desde que a Tecnologia esteja conectada com a Natureza. Como escreve Fritjof Capra:

“Precisamos aplicar nossos conhecimentos ecológicos à redefinição fundamental das nossas tecnologias e instituições sociais, de modo a transpor o abismo que atualmente separa os projetos humanos dos sistemas ecologicamente sustentáveis da natureza. A prática do desenho industrial num contexto como esse exige uma mudança fundamental da nossa atitude em relação à natureza: deixar de pensar no que podemos extrair da natureza e começar a pensar no que podemos aprender com ela.”

Imaginem quantas boas tecnologias, do ponto de vista ambiental, estão engavetadas por terem sido julgadas inviáveis economicamente. Ora, se não são lucrativas, que sejam então subsidiadas! Um conjunto de países enfiou, recentemente, trilhões de dólares em seus mercados na tentativa de amenizar os efeitos da crise econômica global; por que então não gastar alguns bilhõezinhos para salvar a humanidade do colapso? Pois é. . . carecemos, entre outras coisas, de visão de longo prazo e de uma boa dose de consideração para com as gerações futuras.

Felizmente, há cada vez mais pessoas preocupadas com o futuro de nossa civilização; mas, penso eu, as mudanças não estão ocorrendo na velocidade e na profundidade necessárias. Porém, mantenho-me otimista quanto ao futuro e acredito que ainda podemos virar aquele jogo com os habilis pelo “Campeonato Mundial de Longevidade das Espécies”. Só que, como faltam ainda 800 mil anos para esta façanha, temos que mudar de tática e começar a jogar limpo imediatamente. . . ou a Grande Juíza vai acabar expulsando o nosso time de campo.

AVATAR - 1a. parte

Transcrevemos, a seguir, o excelente artigo lavrado pelo ambientalista Antonio Radi, publicado no blog Novosmaias.
AVATAR - 1a. parte.


Deixe-me começar traquilizando aqueles que não assistiram ao filme de James Cameron. . . não vou contar o final não, ok? Longe disso, usarei o longa metragem Avatar como um gancho para algumas reflexões, as quais gostaria de compartilhar com eventuais leitores.

Bem, o roteiro de Avatar não tem lá muita originalidade; humanos, movidos pela cobiça, vão atrás de um valioso minério existente no subsolo de um planeta belo e rico em biodiversidade: Pandora. Há, porém, um problema para os gananciosos exploradores; um povo alienígena denominado Na’vi, que habita Pandora e convive em admirável equilíbrio com o meio que os cerca.

Têm-se a nítida impressão de que Avatar inspirou-se em episódios da História das Américas, quando povos vindos do além mar depararam-se com terras exuberantes e com os nativos que as ocupavam. Os Na’vi parecem-se com nossos índios e os humanos agem como os navegantes europeus que aqui chegaram. . . e, do ponto de vista histórico, conhecemos bastante bem as consequências deste encontro. Sobre o assunto, Darci Ribeiro, em seu livro O povo brasileiro, escreve:

“Os índios perceberam a chegada do europeu como um acontecimento espantoso, só assimilável em sua visão mítica do mundo. Seriam gente de seu deus sol, o criador – Maíra – que vinha milagrosamente sobre as ondas do mar grosso.

Pouco mais tarde esta visão idílica se dissipa. Nos anos seguintes se anula e reverte-se no seu contrário: os índios começam a ver a hecatombe que caíra sobre eles.”

Porém, aqueles que ainda não viram o filme não precisam se preocupar. . . Cameron constrói um desfecho bastante comercial; afinal o filme precisa vender, não é mesmo? E olha que já vendeu pacas!!!

Mais do que as belas imagens e os efeitos especiais computadorizados, chamou-me a atenção no filme o modo de vida do povo Na’vi. Eles estavam, literalmente, conectados com a Natureza que os rodeava e nutriam um respeito sagrado para com cada ser vivo daquele lugar. Isto fica bem explicitado em uma cena onde uma nativa sacrifica um animal ferido e agonizante; antes de desferir o golpe de misericórdia, ela faz uma espécie de prece. Gibran, em seu livro intitulado O Profeta sugere uma atitude semelhante:

“Quando matardes um animal, dizei-lhe no vosso coração: Pelo mesmo poder que te imola, eu também serei imolado, e eu servirei de alimento para outros;

Pois a lei que te entregou às minhas mãos me entregará a mãos mais poderosas.

Teu sangue e meu sangue nada são senão a seiva que nutre a árvore do céu.”

Deixemos agora a ficção e falemos um pouco de História. Quando aportou por aqui, Cabral e os seus toparam com uma terra de Natureza deslumbrante; nela viviam à época, estima-se, entre 6 e 7 milhões de nativos.

Observem, então, que a população humana dispersa naquele território que se chamaria Brasil era muito, muito pequena. Ora, só a cidade de São Paulo tem hoje mais de 10 milhões de pessoas. Assim, não é de se espantar que os recursos naturais de nosso país estivessem praticamente intactos por ocasião da chegada dos primeiros europeus.

Bom, agora vou dar início a alguns questionamentos, ok?

Bem, se a baixa população de pessoas à época do descobrimento permitiu aos portugueses encontrarem aqui uma Natureza preservada, podemos perguntar: Por que a população indígena era pequena? Ora, existem registros da presença de grupos humanos em nosso país datados de 40.000 anos ou mais. Tempo não faltou para o homem (super) povoar todo o atual território brasileiro. . . mas isto não ocorreu. E, pelo que se sabe, não vigorava entre os nativos nenhuma campanha em prol de métodos contraceptivos.

Penso que uma palavra é fundamental para respondermos a questão acima: Tecnologia. Os índios possuíam uma tecnologia, digamos, “rudimentar” que pouco dano causava ao meio em que viviam. Esta mesma tecnologia, digamos, “primitiva” também não lhes possibilitava uma longa expectativa de vida (a idade média não ultrapassava os 40 anos, segundo o professor Paulo Jobim, do Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia). Assim, a população mantinha-se, de forma natural, relativamente estável. Ah!!! Aqui vai mais uma informação pertinente: a despeito de toda a Hi-Tech hoje disponível, nosso índio vive, em média, apenas 48 anos, segundo o IBGE.

Neste ponto, atrevo-me a propor uma situação hipotética. Imaginemos que nossos índios dominassem uma tecnologia que poderíamos entender por “avançada”. Neste caso, será que sua população ficaria estacionada em apenas alguns milhões de pessoas? Se nossos indígenas dispusessem de “alta” tecnologia, o que os lusitanos encontrariam por aqui? Uma terra bela e preservada ou um território sujo e devastado?

Se quisermos exercitar um pouco mais a imaginação, podemos ainda especular sobre o seguinte: Por que, em milhares e milhares de anos, os índios não desenvolveram uma tecnologia que pudesse ser chamada de “avançada” pelo modelo civilizacional vigente?

Bem, imagino que não exista uma só resposta para estas questões. Mas, deixando o passado e voltando ao presente, pretendo, na Parte 2, elaborar e comentar questionamentos, digamos, mais oportunos. . .então, até lá!