sábado, 25 de setembro de 2010

NOSSO LIXO DE CADA DIA

A Natureza, como sempre, é sábia. Não exatamente isso. Ela é a resultante de 3,7 bilhões de anos de exercício da dinâmica evolucionária dos seres vivos, fundamentada na força de atração ou repulsão dos átomos. Ela se definiu, fundamentalmente, pelas condições temporais do meio ambiente da ocasião, provocando o ajustamento ou perecimento das espécies surgidas em seu bojo, com o conseqüente aprimoramento e fortalecimento da Vida planetária.

Atualmente, a Natureza tem uma experiência de adaptação de mais de três bilhões de anos. Isso deveria causar grande inveja ao infantil e arrogante “homo sapiens” que tem existência aproximada de 50 mil anos. Não só inveja. Respeito, admiração, aprendizado e submissão, tal como a emoção vivencial da criança perante o pai ou a do adulto ante Deus.

A Natureza, “quando viu que seu trabalho de criação estava pronto”, ofereceu esse Paraíso ao homem, juntamente com as potencialidades da razão. Daí em diante, tudo ia bem até que alguém inventou a propriedade da terra, não percebendo que isso equivalia a mutilar seu Paraíso e esquecendo que a terra não o acompanharia na morte. Pelo contrário, ela o engole na sepultura. Em consequência, foi preciso inventar o dinheiro, inicialmente representado pelo ouro extraído da terra, que gerou a noção material de valor, produzindo uma volúpia de posse tão forte e infinita que passou a governar o mundo até os dias atuais.

No planeta, o corpo de tudo que tem vida – produtos orgânicos – se recicla naturalmente. A Natureza o faz em ritmo próprio, reduzindo-o ao ponto inicial de outro ciclo vivencial; automaticamente e de graça. Um animal qualquer pode comer uma banana e jogar a casca no chão que ela, com a intervenção dos microorganismos, volta à mineralização, alimento básico do reino vegetal e, consequentemente, de toda a cadeia alimentar. As folhas de uma árvore que caem sob a copa no outono são, da mesma forma, mineralizadas, voltando a alimentar a Vida.

Em princípio, tudo que existe na biosfera é orgânico ou será metabolizado para a finalidade. Os metais, associados a um sal, fazem parte das condições vitais, mas puros – chamados metais pesados – constituem veneno. O ecossistema aceita em seus domínios produtos inorgânicos, mas dentro de certas condições e quantidade que não prejudiquem o equilíbrio ambiental. No entanto, a atividade fabril moderna joga no ambiente os metais pesados e diversos subprodutos químicos, envenenando nossos meios básicos de vida. É a irracionalidade sobrepujando o conhecimento. Isso tem nome: suicídio.

Dizem os informes estatísticos que o descarte mundial aumentou em 7,7% de 2008 para 2009, percentual superior ao aumento populacional. Claro! O modernismo, com suas tecnologias de conforto, produz bens em quantidade suficiente para atender aos desejos crescentes de consumir, consumir, consumir, o que redunda em mais lixo, lixo, lixo.

Potencialmente, tudo o que é produzido hoje pelas indústrias será lixo num futuro em curto, médio ou longo prazo, dependendo do desgaste ou dos caprichos e potencialidades do desejo humano. Vejamos em nossa casa quanto lixo potencial está guardado.

A manipulação química em grande escala dos combustíveis fósseis, materiais radioativos e dos compostos inorgânicos, extraídos da crosta terrestre, introduz no paraíso terrestre elementos estranhos – em quantidade enorme – que deturpam as condições mínimas para a existência dos seres vivos. Isso equivale a dizer que as atividades industriais estão destruindo o paraíso, o que pode ser visto ou deduzido por qualquer humano capacitado para se informar e pensar.

Boiando no oceano Pacífico Norte acha-se a maior concentração de resíduos do mundo, equivalente ao Estado do Paraná, constituído principalmente de material plástico descartado pelos irresponsáveis do mundo e que são muitos; justamente o excesso populacional.

Ouve-se com muita freqüência a expressão “jogar fora”. Isso não existe. Emprega-se geralmente essa frase no sentido de destruir. Nada se destrói; muda-se algo de lugar ou se o transforma. Essa é a lei física.

Lixo é definido como tudo o que não tem utilidade. Basicamente, só não é lixo o alimento dos seres vivos. O mais é ou o será. Incinerando-o, ele não é destruído. É transformado em gases venenosos e cinza que, mais cedo ou mais tarde, se depositarão sobre a terra, ocasionando a dispersão do que ainda continua a ser lixo por muito tempo. A Natureza o transforma no final, mas no ritmo dela, completamente incompatível com a pressa da modernidade. Enquanto o progresso se move a 100 km/h, a Natureza age ao compasso de 0,1 cm/h. Essa defasagem é mortal.

Segundo informes estatísticos, um brasileiro produz em média 4 k de lixo inorgânico por mês. Os americanos, 10 k por mês. O mundo, 5 k. Isso equivale à produção mensal mundial de 33.500.000 toneladas de entulhos, representando uma sobrecarga enorme para o meio ambiente. E cada vez, esta civilização equivocada produz mais lixo. Até quando?

A modernidade americana, representada pelo seu povo, “joga fora” computadores, geladeiras, automóveis, ao tempo em que compram outros novinhos, atualizados pelo último lançamento, procedendo assim ao acúmulo crescente de lixo e manutenção do vício de consumir. No Brasil, já vemos nas grandes cidades o descarte de objetos em bom estado, como sapatos, televisores, colchões, roupas, pelo simples fato de que eles estão fora da moda.

Pensando bem – sem conotação metafórica –, o planeta está se transformando num imenso lixo.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A FORÇA MUNDIAL DO MATERIALISMO

O mundo, como uma cebola, possui as suas camadas carnosas de mando efetivo. Visão nada parecida com a do poeta Neruda. Ele tratava de poesia, de pensamentos quiméricos, de sonhos. Aqui, nossa referência pretende ser didática. Nesse tubérculo bulboso existe uma escala hierárquica em que a primeira escama – a de fora, a maior, a mais forte – aprisiona rigidamente a inferior, a qual, por sua vez, exerce controle prisional à seguinte, e assim por diante.

No aspecto equivocado por que atravessa a atual sociedade mundial, estruturada nos moldes prisionais de estrita observância dos interesses econômicos, os problemas ecológicos não estão devidamente equacionados para as necessárias providências.

Baseamo-nos, naturalmente, no poder de decisão, única força capaz romper os grilhões da linguagem econômica destrutiva que envolve a ecologia e dita as normas que lhe convém.

Atualmente, com exceção de pouquíssimos pequenos e heróicos países, os poderes militar, político, midiático, religioso e econômico se aglutinam estrategicamente nas primeiras cascas carnosas do mencionado bulbo e sufocam o mundo interior, ajudados pelo acumpliciamento e conveniência das escamas subalternas.

Apesar de a atual civilização materialista do conforto, individualismo e ganância desmedida estar mostrando com evidências as conseqüências de seu procedimento, o mundo humano, cego e surdo, caminha célere rumo ao precipício que o levará à autodestruição. Tudo em holocausto ao deus dinheiro. E o pior: arrastará consigo todos os belos atributos do espírito, inteiramente ignorados e desvalorizados, na ânsia da tresloucada luta para a posse de bens materiais. Mas quem conduz, com mão de ferro, esse destino irracional? Os “donos do mundo”.

Essa visão, na organização capitalista, obedece ao princípio dos benefícios materiais para os indivíduos, enquanto, na organização socialista, os mesmos benefícios são espargidos para toda a sociedade humana. Mas ambos os tipos de organização social se suprem irracionalmente das fontes limitadas da Terra, ignorando os interesses maiores do habitat mundial. Nesse aspecto, os efeitos acabam sendo idênticos.

Entendemos que todos os humanos normais possuem a capacidade de senso crítico. Não o usando – como ocorre com a maioria da população –, passam a ser escravos lenientes do sistema em que vivem, acorrentados às mentes alheias, profissionais da espécie tais como os produtores de marketing e os intérpretes divinos.

Essa situação não depende de instrução escolar. Já temos visto doutores com curso superior incapazes de usar esse atributo de discernimento, enquanto – com menos freqüência – homens incultos, analfabetos, brandem suas próprias conclusões sobre os procedimentos racionais. Questão de lógica, de uso de atribuições espirituais por esforço próprio. Capacidade mental não usada atrofia. Bem diz um antigo provérbio: “quando a cabeça não trabalha, o corpo padece.”

De nada adiantam essas reuniões ambientais promovidas pelas autoridades locais, estaduais, federais, de regiões geográficas ou mesmo mundiais, porque ali não estão presentes as verdadeiras autoridades globais, os possuidores do poder decisório: os verdadeiros e efetivos “donos do mundo” que habitam e constituem a primeira capa da cebola. Mas qual a verdadeira identidade dos “donos do mundo” que traçam o destino de cada um de nós?

Todos têm conhecimento de que os EE.UU., representados pelo seu presidente, enfeixa em suas mãos uma autoridade imensa, apoiado em 757 bases militares distribuídas pelo mundo e os armamentos mais poderosos e sofisticados. Mas acima dele encontra-se a recôndita e verdadeira autoridade com poder efetivo de mando. Seu nome, de ordem coletiva, citado em 1961 pelo general e presidente Eisenhower, em discurso de despedida de 8 anos na presidência, equivale e corresponde ao seu verdadeiro papel: complexo industrial militar. Ele, soldado de carreira, conhecedor profundo de toda a máquina militar, corajoso, assumiu a responsabilidade de identificar, sem rodeios, o verdadeiro mandante do país e dos destinos do mundo. Quis deixar para a posteridade o dedo acusatório do responsável por todos os atos imorais e criminosos praticados pela grande nação.

As ações dessa verdadeira e efetiva autoridade, oculta e não institucionalizada, como lhe convém, enfeixa em suas mãos o supremo poder mundial, pois decidem tudo – pela manipulação da mídia – desde a moda feminina de sapato até a invasão militar a um país mais fraco. Esse poder efetivo, infelizmente, não tem a menor noção do que seja ecologia.

E tudo isso por apego insano à palavra síntese que é, ao mesmo tempo, motor da religião, política, sociedade, vivência e legítimo deus da vida materialista sem espírito: riqueza.

Contribuem para essa situação, inteiramente irracional, as ações de diversas instituições que estão arraigadas nas camadas inferiores do bulbo social. Fazem parte da linguagem de comportamentos e atitudes dos não-pensantes, pretendendo apenas manter suas posições e privilégios. Citamos a seguir alguns exemplos que consagram bens materiais como a visão única da finalidade da vida:

a) algumas religiões pregam que os ricos são ricos porque Deus os escolheu para serem ricos. Com isso, mantêm na conformidade os pobres e chamam a proteção dos ricos;

b) outras instituem o celibato aos sacerdotes para que vertam à Igreja todo o produto de seus trabalhos. Motivo exclusivamente financeiro. Não havendo família, não há despesas nem herança;

c) os governantes atuais se movem em função de interesses econômicos das empresas de seus países, como vemos por esse mundo afora. O Primeiro Ministro da França vem ao Brasil para vender seus aviões. O Rei da Suécia se desloca de seu conforto para tentar ser o escolhido na venda dessa arma. Os EE.UU julgaram suficiente um simples telefonema da Secretária de Estado;

d) a publicidade se referencia sempre nos aspectos materiais de um produto, usando as emoções dos consumidores para atingir esse objetivo;

e) a cultura é produto de mistura do caldo econômico com os desejos primários do povo, valorizando a matéria nas relações sociais, a começar pelos laços estruturais da família.

Essa linguagem materialista, reinante nas escamas mais externas, serve aos objetivos de vida dos “donos do mundo”. Quanto aos interesses maiores de preservação da Natureza, fonte e sustentáculo da biodiversidade e da própria cebola, são sufocados pelo desdém e ignorância aos valores espirituais da Vida. Mas – reconheçamos – o sistema bulboso é gratificado pelas camadas internas da cebola, consumindo, consumindo, consumindo.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

PODE O CAPITALISMO SER SUICIDA?

Temos o prazer de divulgar abaixo o claro artigo de Leonardo Boff, salientando importantes deduções lógicas ali contidas. Seu raciocínio percorre caminhos que corroboram pontos essenciais apresentados no correr de nosso trabalho, tais como: necessidade de um governo global incisivo, controle populacional, descompasso entre ação e reação, gravidade da situação ambiental.

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“Desde o período neolítico, por volta de 10 mil anos atrás, o meio ambiente da Terra era mais ou menos estável, como pode ser comprovado cientificamente, analisando-se as camadas de gelo do permafrost. A grande transformação ocorreu com o processo industrialista, especialmente no após-guerra, e com o surpreendente crescimento populacional. Começaram a se lançar anualmente na atmosfera bilhões e bilhões de toneladas de gases de efeito estufa (dióxido de carbono, metano, óxido de azoto e ozônio), a ponto de o sistema natural não conseguir mais absorvê-los. É a causa fundamental do aquecimento global.

Este não seria um novo ciclo natural da Terra, mas algo induzido pelas práticas humanas. A Organização Meteorológica Mundial (OMM) elaborou modelos teóricos que nos permitem previsões confiáveis. Segundo ela, de agora até o ano 2100, as temperaturas se elevarão entre 1,8 a 6 graus Celsius, estabilizando-se por volta de 2 a 3 graus. O nível do mar subiria de 18 a 59 centímetros. Tudo isso à condição de se fazerem, a partir de agora, pesados investimentos (cerca de 460 bilhões de dólares anuais) para estabilizar a temperatura da Terra. Sem esse empenho coletivo, desapareceriam cerca de 20 a 30% das espécies animais e vegetais e o número de vítimas humanas poderia chegar à cifra dos milhões. As secas, a desertificação e a salinização dos solos privaria de água potável cerca de três bilhões de pessoas, fazendo crescer em 600 milhões os que já passam fome. Os "refugiados ecológicos" serão milhões que não aceitariam passivamente o veredito de morte sobre suas vidas e invadiriam regiões mais favoráveis à vida.

Estas não são profecias de mau agouro, mas apelos dirigidos a todos os que alimentam solidariedade geracional e amor à Causa Comum. Há um obstáculo cultural grave: estamos habituados a resultados imediatos, quando aqui se trata de resultados futuros, fruto de ações levadas a efeito agora. Como afirma a Carta da Terra: "As bases da segurança global estão ameaçadas; essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis". Esses perigos somente serão evitados caso mudemos o modo de produção e o padrão de consumo. Essa reviravolta civilizatória exige a vontade política de todos os países do mundo e a colaboração, sem exceção, de toda rede de empresas transnacionais e nacionais de produção, pequenas, médias e grandes. Se algumas empresas mundiais se negarem a agir nessa mesma direção, poderão anular os esforços de todas as demais. Por isso, a vontade política deve ser coletiva e impositiva, com prioridades bem definidas e linhas gerais bem claras, assumidas por todos, pequenos e grandes. É uma política de salvação global.

O grande risco, visto por muitos, é na lógica do sistema do capital globalmente articulado. Seu objetivo é lucrar o mais que pode, no tempo mais curto possível, com a expansão cada vez maior de seu poder, flexibilizando legislações que limitam sua voracidade. Ele se orienta pela competição e não pela cooperação. Diante das mudanças paradigmáticas, ele se vê confrontado com esse dilema: ou se auto-nega, mostrando-se solidário com o futuro da humanidade e mudando sua lógica, assim correndo o risco de ir à falência, ou se auto-afirma em sua busca de lucro, desconsiderando toda compaixão e solidariedade, mesmo passando por cima de montanhas de cadáveres e da Terra devastada. Muitos temem que, fiel à sua natureza de lobo voraz, o capitalismo se faça suicida. Prefere morrer e fazer morrer a perder. Oxalá a vida supere a lógica.”

Fonte: Fábio Oliveira – fabioxoliveira2007@gmail.com
          Fabioxoliveira.blog.uol.com.br/